Recentemente, acompanhamos uma verdadeira enxurrada de posts e comentários sobre a apresentação de Rhodália Silvestre no Portugal Got Talent, um programa cujo objectivo principal é dar visibilidade a pessoas talentosas que, muitas vezes, não têm acesso a grandes plataformas para mostrar suas habilidades.
No contexto do luto nacional, a voz da “meia moçambicana” nascida no Reino de Eswatini e filha de um dos raros africanos formados em regência de orquestras — mentor do Majescoral (Maputo Jazz Espiritual Coral) — não só provocou arrepios, mas também trouxe alívio e alegria em meio ao caos causado pela violência policial que se vive no país do pandza.
Muitos comentaram, e, acertadamente, destacaram a brilhante performance de Rhodália. Confesso que até procurei por opiniões que abordassem a questão de forma mais crítica, mas não encontrei. Assim, tudo indica que sou eu quem vai ser considerada a “chata da história”. Antes de mais nada, permita-me afirmar, de forma clara e em bom som: aquela “wansati” nos representou bem! No entanto, estou triste porque artistas com o talento, idade e habilidade dela, ainda concorrem nesses realities para ganhar reconhecimento e contratos que precisam e merecem.
Isso nos leva rapidamente a reflectir sobre os “culupados” dessa situação. A Indústria Cultural e Criativa (ICC), que é um conjunto de actividades económicas baseadas na criação, produção, distribuição e comercialização de produtos e serviços culturais e criativos, tendo como principal matéria-prima, a criatividade, o conhecimento e o talento humano. Está intimamente ligada à cultura, tecnologia e inovação. Sobre o funcionamento de toda essa cadeia de valor ou não em Moçambique, cabe a cada um julgar de acordo com a definição apresentada acima. No entanto, o Instituto Nacional das Indústrias Culturais e Criativas é uma instituição que existe e vigora em Moçambique.
Indubitavelmente, o Governo precisa criar valor económico para os artistas, o que significa que, devem ser geradas oportunidades financeiras de sustentabilidade para os profissionais das artes e das áreas criativas para evitarmos essa volatilidade que não é de hoje. A ICC permite que os artistas monetizem suas criações, encontrem novos mercados e ampliem seu impacto económico de várias maneiras.
Em suma, Rhodália é um monstro da música moçambicana. O palco do Got Talent pode até trazer visibilidade e possíveis contratos (os quais espero que ela conquiste), mas não deixa de ser pequeno para uma vencedora de vários prémios, como o Prémio Revelação Ngoma Moçambique 2017, a Melhor Voz de Moçambique no Ngoma Moçambique 2018, de novo a Melhor Voz no Ngoma Moçambique 2022, e ainda o Prémio Vibratoques da Vodacom. Seu portfólio artístico inclui projectos e colaborações com grandes artistas, além de apresentações nos principais palcos, como o Cape Town Jazz Festival em 2011, Bushfire, Azgo, Lake of Stars, entre outros.
Chega de finais trágicos para os nossos artistas. A arte é trabalho e o artista é trabalhador, portanto, precisa ser respeitado e valorizado.

Biléria Tomo
Formada em Ciências da Comunicação, com especialização em Jornalismo e Relações Públicas pela Universidade Politécnica, sou movida pela paixão pela rádio, onde actuei durante 6 anos da minha trajectória profissional. Nesse período, dediquei-me ao jornalismo cultural, estabelecendo conexões com diversas casas de cultura e colaborando em inúmeras iniciativas culturais em Moçambique.
Com uma paixão inesgotável pelo jornalismo cultural e seu papel transformador, continuo minha jornada como jornalista e copywriter, explorando novas formas de contar histórias e conectar pessoas por meio da comunicação.