Eu sempre gostei de falar. Muitas vezes até falo alto. Tudo bem que falo aberta e espontaneamente quando estou com os meus, recolhido ao meu círculo de amizades. E, quase nunca, atrevo-me a incursões oratórias quando estou em ambientes em que me sinto estranho. Causa-me um desconforto. Tenho vergonha, às vezes medo. Vergonha de ser presunçoso, às vezes medo de ser incompreendido. A vergonha e o medo são sentimentos que devem acompanhar uma vida adulta. Quem perde o medo e a vergonha, já disse alguém um dia, já não lhe falta muito para andar nu na rua.

Enfim, gosto de falar e falo muito. Para os que me conhecem e me tem sempre por perto reclamam das minhas longas epopeias, gigantes desabafos, reflexões (des)medidas e corajosas teses. Costumo ser porta-voz dos mais retraídos, sou a ampliação sonora dos tímidos, quebro paradigmas discursivos e me atrevo a assumir abordagens que muitos não ousariam em voz alta. Bom, esse sou eu! Quem me conhece de verdade, na intimidade do meu eu, deve estar a concordar agora.

É exactamente por isso que o “Entre Aspas Talks”, esta proposta de falarmos…, que inicia hoje (10), não deve ser surpresa. Tudo bem que não serei eu a falar, mas colocar pessoas a dizerem coisas, sobretudo quando são importantes (as coisas e as pessoas) é, para mim, cumprir com o propósito quando estou nas minhas esquinas linguísticas. É prazeroso ouvir alguém a dizer coisas dos quais têm paixão e domínio, melhor ainda se forem coisas que as estudou, seja formal ou informalmente. Digo isso porque eu, que aqui sirvo como exemplo, falo de jornalismo com paixão (e algum domínio), mas estudei informalmente, não na academia, como muitos devem estar a pensar.

Aliás, estudar é mais do que aquecer a carteira, é ampliar os seus horizontes cognitivos à sua maneira ou, como diz o outro, à maneira-maneira. Portanto, esta proposta de “talkar”, que estamos a criar a partir de hoje, é para os estudados (na carteira) e os estudados (na vida).

Começamos bem, é verdade, com quatro profissionais, que por mais que sejam jovens, já andam nas lides emocionais e mentais há muitos anos, são especialistas e especializados e falam com propriedade, para não dizer que vivem com propriedade estes assuntos. São dois psicólogos – Cândida Muvale e Carlitos Mugodoma – uma nutricionista – Karen Mahomed – e um técnico de saúde e artista – Bento Sambo, o Masta Tuga.

Em qualquer parte do mundo estes quatro são e fazem notícias. É, no fundo, o que nós queremos: fazer notícia. Até porque esse é o pretexto da Entre Aspas com esta iniciativa que se inicia hoje. Se fazemos notícias com conversas dos outros o que nos impede de fazermos as nossas próprias conversas, sobretudo quando há um mar à nossa vista? Começar neste restaurante tem o mesmo sabor de quem começa um namoro num jardim, ou debaixo da lua-cheia, ou à beira-mar, tal como aqui onde estamos, sobretudo quando temos um Sir Lovely para aguçar a nossa alma e refrescar a nossa mente. Não sei se alguém vai sair daqui a namorar, e nem nos apetece esse perfil de cupido, mas pelo menos a Entre Aspas descansa o universo virtual, e começa um namoro com as pessoas, com as palavras, com a retórica, com a arte de partilha. Poderia ter dito “arte de falar”. Só que falar só por falar é igual a falar à toa. E não é este o caso, sobretudo no caso de falar sobre saúde mental. A mente nunca fala à toa.

À terminar, sei que devia o ter feito faz tempo, desejo-vos um rico e prazeroso debate, como aqueles que tenho lá na zona, quando estou em altos mares discursivos com os meus.