Recebi a mensagem de Kelver Matsinhe dia anterior ao Dia D, ou melhor, ao Dia M – de Monte, mas também pode ser de Mansidão, Misericórdia, Meditação, Milagre e Missão. É que, no último sábado (7), no cume do Monte Êxodo, foi realmente isso que se viveu, se sentiu e se partilhou.
Depois de lida a mensagem, naquela bagunça da manhã, parabenizei ao meu parceiro pela iniciativa fora do quadrado das ideias comuns. Sugeria, afinal, um Retiro Empresarial. E como se não bastasse com um tema para lá de revigorante e, pertinente, se quisermos: “Restaurar para liderar”. Lá no meu subconsciente dizia bem devagar – “preciso disto!”. E precisava mesmo – e com urgência. O meu subconsciente parece ter falado alto demais, ou o Kelver tem talento em ler mentes e afirmou, logo a seguir, “conto consigo!”. Baixei o rosto, como se ele estivesse em minha frente, declinando o convite, e não tardei: “Não me inscrevi, infelizmente”. “E se te oferecer uma vaga?”, chutou ele, aceleradamente, como se soubesse o que eu estava a espera de ouvir. A minha cabeça voltou ao lugar, alonguei o meu corpo duro, ganhando algum ânimo e respondi: “aceito, posso ir”. Naquele segundo, até porque já não havia mais a falar, o homem sentenciou: “vamos!”
Como combinado, às 11h00, estava na Etrago, ali na Karl Max, ao lado da loja que nos serve para comer. Cheguei cheio de estilos, como se tivesse pago o bilhete, com o direito a um câmara-man a registar os meus passos. Encontrei alguns conhecidos. Onésimo Singa era um deles. Não me espantei. É um homem que respeita o tempo como ninguém. Sempre que marcamos algo, sou eu a encontra-lo (excepto uma vez).
Para melhor localização do meu entusiasmo e ansiedade, avisei ao meu parceiro que já estava no local. Mesmo com a tarefa de falar com todos e de gerir todo o cenário, o homem teve a amabilidade de me escrever de forma longa e respeitosa. Resumindo, dizia para ficar à vontade e embarcar. Virei imediatamente para o autocarro, no centro do pátio, esbanjando charme e formosura. E disse aos meus botões: “não deve ser este das viagens interprovinciais. À parte. Fui deixar as minhas trouxas e voltei ao acento, apreciando os líderes de verdade, aqueles que pagaram bilhete.
A hora de partir chegou 30 minutos depois do combinado. Não pela (des)organização. O Kelver Matsinhe e Nilza da Graça já estavam no local faz tempo e dando cordas e coordenadas para quem quisesse uma saudação ou, até, uma explicação. Respeitosos, esperavam, ainda, pelos atrasados. Uma espera longa, convenhamos, com apelos e hossanas e tudo.
E, finalmente, o meu estômago parou de provocar barulho. O que roncava, naquele momento, já era o motor. E lá fomos. Era como se fôssemos ao paraíso, pelo menos o autocarro e as suas mordomias davam essa indicação: assentos confortáveis, perfume climatizado, uma música-ambiente e, para fechar, um microfone para dar as devidas indicações de tudo quanto era possível partilhar com os presentes.
Chegámos à Namaacha por volta das 15h00. Poderíamos ter chegado antes. Mas para que precisávamos de correr. Já corremos tanto para colocar combustível nas nossas empresas. Aquele era um dia de pausa e de paz, entre outros Ps libertadores. Ainda bem que o pé do motorista estava peve e pranquilo, ou melhor, leve e tranquilo. Desgraçados Ps!. Assim, nem os buracos da estrada, nem dos condutores indisciplinados não se atreveram a estragar a nossa viagem.
Era como se tivéssemos chegado ao céu, ou perto disso. Ali, à entrada do Monte Êxodo, uma paz interior tomou conta dos meus movimentos e, já na roda, as orações do líder António Sendi tranquilizaram-me ainda mais os sentidos. Lá fomos nós: um atrás do outro, cada um com a sua mochila, com os seus sonhos e com as suas lutas.
Entre pedras e arbustos, respirações leves e carregadas ganhavam altitude: uns iam mais rápido, outros preferiam passos ponderados; uns falavam mais, outros optavam em ouvir a respiração da montanha; uns descansavam, mas os outros não atendiam ao cansaço. Enfim, 30 minutos depois já estávamos no cume da montanha, inteiros, felizmente.
Sombras, cadeiras e uma música-miúda esperavam por nós, principalmente uma mesa com banhos-maria. É para lá onde todos os olhos atacavam. Não é para menos, houve jejum da meia-noite até àquela hora – fazia parte da excursão. Eu também jejuei. E, na verdade, só me apercebi que ainda não tinha comido quando os banhos-maria focavam-me à vista, desesperadamente.
Antes de mais, houve as apresentações dos líderes presentes naquele retiro. Estavam lá figuras sublimes, daqueles que devemos estar com elas todos os dias: comunicadores, bancários, informáticos, advogados, psicólogos, agentes de seguros, médicos, entre outros profissionais. Aliás, aquelas apresentações foram o “quebrar do gelo”, pois, ali, deixamos de ser estranhos uns com os outros e começaram as paqueras profissionais – à venda do peixe. Eu vendi o o meu peixe, mas não peixe, um livro produzido pela Kuvaninga. Para além de ter vendido a Tindziva e a Entre Aspas. Agora só me falta comprar… e está para breve.
Não fomos às sessões antes de contemplar o pôr-do-sol, isso depois de uma refeição saudável e deliciosa. Pela primeira vez, eu e o meu telemóvel registamos imagens a partir de uma montanha e assistimos o sol a deitar-se ali mesmo, na nossa (santa) companhia.
Uns sentados em cadeiras e outros em bancos de esponja, acompanhamos o coach Marcos Chambule a conduzir o retiro com a perfeição dos deuses. Gestos para descontrai e sermões para instruir faziam parte do pacote. Entre a sua moderação falou-se de quase tudo que eu queria ouvir, até parece terem-me consultado na hora de elaborar os temas: Hélio Langa falou da importância da saúde física e autocuidado como pilares da liderança sustentável; António Sendi, a seguir, explorou o papel da fé e o alinhamento interior na tomada de decisões; já Izidine Jaime destacou as premissas que levam um empresário a posicionar-se com autenticidade e como manter credibilidade no mercado; Vicente Sitoe, por sua vez, fez uma abordagem estratégica sobre o papel dos gestores na retenção de talentos e construção de equipas sólidas.
A lareira estava ao rubro, para fazer face ao frio que insistia em penetrar nos casacos e camisolas… e só faltava mergulhar nos ossos. A essa hora, mantas e lençóis também tinham fugido das pastas. Aliás, quase todos os participantes tinham fugido dos assentos, aproximando-se às porções de lenha e bocados de carvão.
Ainda bem que estávamos de pé, assim combinamos com o vigor da única mulher no painel – Nádia XL – quem falou sobre um tema muito debatido, que é a forma de ser e estar do empresário; Alfredo Uamba abordou a questão legal e da integridade na gestão de empresas e instituições e, por último, já no fervor da madrugada, Carlos Nhamahango falou sobre quatro regras de execução, entre outros temas transversais como o “consciente e o subconsciente” e o “ego e a sabedoria”.
O sol, que se tinha deitado aos nossos olhos, acordou e nos encontrou intactos, a transbordar leveza, na mente e no espírito. Sim, estávamos restaurados. Desci do monte diferente de como o escalei, claramente: pronto para liderar, mas liderar com êxodo, aliás, com êxito!
Nota: sobre o que se discutiu, aguardem a revista Entre Aspas da edição Junho/Julho.

Elcídio Bila
Elcídio Bila é jornalista há 10 anos, escrevendo sobre artes e outros assuntos transversais. Tem passagens por dois órgãos de comunicação e diversos projectos de Media. Trabalha também como copywriter e Oficial de Relações Públicas em agências de comunicação. É fundador e director editorial do projecto Entre Aspas.